REGO, Maria Paula Klingelhöefer
Funchal, fl. 1861 – Funchal, 01/06/1922
Intérprete de piano, machete, viola e harpa. Maria Paula Klingelhöefer Rego destacou-se também na organização de saraus de beneficência, em que reunia os melhores artistas e músicos da época, para apoiar materialmente o "Asylo de Mendicidade e Órfãos".
Maria Paula Klingelhöefer Rego descendia de uma família abastada que possuía inúmeros terrenos e quintas na ilha da Madeira, especialmente na zona na norte em Ponta Delgada, Boa Ventura, São Jorge, Santana e também propriedades no Funchal. Entre esses espaços conta-se a Quinta do Trapiche, atualmente denominada Casa de Saúde de S. João de Deus.
Organizadora de saraus de benificência dedicados às artes, em especial à música, para apoiar instituições dedicadas à assistência social. Maria Paula Klingelhöefer também participava nos concertos organizados com peças tocadas ao piano, viola, machete e harpa. Como intérprete era reconhecida pelos músicos da época devido ao seu talento e apresentaçoes musicais de grande qualidade técnica.
Sobre a vida pessoal e familiar de Maria Paula Klingelhöefer Rego existem poucas informações registadas, para além da sua naturalidade registada no Funchal. No entanto, não foram encontrados registos com a sua data de nascimento, apenas é possível datar a sua vivência a partir do ano em que iniciou a atividade social, através de um concerto realizado no Palácio de S. Lourenço: de acordo com a edição de 21 de Março de 1861, do jornal A Voz do Povo.
Quanto à formação académica que lhe permitiu desenvolver o nível de execução musical em vários instrumentos, canto e composição, Platão de Vakcel refere, em artigo publicado na obra A Madeira e a Música – Estudos [c. 1508 – c. 1974], que Maria Paula K. Rêgo teve como mestre de piano António José BernesI.
Em 1869 Platão de Vakcel publicou na Gazeta da Madeira, um artigo sobre a música madeirense, onde destacou os músicos com mais notoriedade na época: Cândido Drumond de Vasconcelos, reconhecido machetista; Júlio da Silva Carvalho, violinista; Agostinho Martins, também violinista; José Sarmento, pianista e organista; Artur Sarmento, concertista; Carolina Dias de Almeida, cantora; e Maria Paula Rego, referida como pianista e harpista.
Na execução musical Maria Paula Klingelhöefer Rego foi uma exímia intérprete de machete, contemporânea de Cândido Drumond Vasconcelos, com quem chegou a partilhar o palco.
Para além da atividade musical Maria Paula Klingelhöefer trabalhou na organização de saraus de beneficência, principalmente direcionados para o "Asylo de Mendicidade e Órfãos", para o qual também fazia donativos com frequência. Em 1873 o jornal A Voz do Povo referiu várias ofertas da machetista a esta instituição “(…) pela parte do seu concerto destinado ao Asylo, o seguinte: = 30 kilog. de macarrão, 1 latinha de marmelada, 12 almofadas de lã, 4 laminas com seus vidros, 6 garrafas de vinho, 3 e meia de aguardente com infusão de marcella, mel d'abelhas, erva doce e flor de laranjeira, e 4 boiões de vinagre, tudo no valor de 16$160 reis, e em dinheiro 10$000(...)”.
Nas décadas 1860 e 1870 Maria Paula K. Rego surge diversas vezes referenciada nos jornais da época, sobretudo no âmbito dos saraus musicais em que participou.
Em Março de 1861 realizou-se no palácio de S. Lourenço um sarau a benefício do "Asylo de Mendicidade e Órfãos". De acordo com a publicação do jornal A Voz do Povo participaram "as ex.mas snr.as D. Júlia Netto, Rego, Azevedo e Mascaranhas, (…) a primeira cantando, a segunda tocando piano, a terceira machetinho e a quarta harpa (…)"II. Ainda em Março de 1861, Maria Paula K. Rego tocou a solo durante um sarau organizado pela Condessa de Farrobo e Júlia de França Neto.
O jornal A Flor do Oceano referiu que "a Sr.ª K. Rego, já conhecida do público nestas festas de caridade, [terá executado] no piano peças dificílimas, com uma delicadeza e gosto de que somente são capazes o talento e estudo quando reunidos. A peça de Bravura, porém, no primeiro concerto é uma das que executará na repetição [deste concerto], demonstrando de que é capaz, uma amadora de música (…)"III.
Em Março de 1865 Maria Paula Klingelhöefer Rego organizou promoveu vários saraus de beneficência numa temporada de concertos nas salas do Palácio de São Lourenço. De acordo com a edição de 17 de Março d’A Flor do Oceano um dos concertor começou com a "(…) symphonia de Guilherme Tell opera do immortal Rossini, a 8 mãos, executada pela ex.ma sr.a D. Maria Paula K. Rego, e srs. Stiler, Berezovsky e Bernes. Repetir-se-hão as peças que melhor teem agradado nos ultimos concertos, e entrarão outras novas, tomando parte em umas e outras todos os amadores que se acham nesta cidade (…)"IV.
Na década de 1870 Maria Paula Klingelhöefer Rego continuou a organizar e promover vários saraus, com especial destaque para os espetáculos de 1871, realizados entre Fevereiro e Abril, no Palácio de S. Lourenço.
Estes eventos ficaram registados na história musical da Madeira como uma "temporada artística" de qualidade, em que participaram alguns dos melhores artistas madeirenses da época: Artur Sarmento; José Sarmento; António José Bernes e Germano Soares.
Maria Paula K. Rego organizou os saraus em conjunto com a pianista amadora Maria Telles da Gama e participou ativamente com a interpretação de peças em conjunto com outros músicos e a solo.
Para além dos referidos artistas profissionais participaram várias senhoras da alta sociedade, que se dedicavam a causas de beneficência, à semelhança de Maria Paula K. Rego e que, de acordo com a educação em voga, detinham conhecimentos musicais interpretativos: Joanna Gil B. de Macedo; Maria Telles da Gama; Maria Amelia da Camara, neta de Ricardo Porfirio d’Afonseca; e Izabel Lampreia.
O repertório desta temporada consistiu nas "(…) harmonias de Thalberg e as deliciosas melodias de Beethoven", tocadas Silvana de Sant'Anna e Maria Paula K. Rego; "dueto do Trovador admiravelmente cantado" por Joanna Gil B. de Macedo; "Maria T. da Gama, magistralmente acompanhada pela Exm.ª Snr.ª D. Maria P.K. Rego, mostrou no dueto de Wolf o talento e os dotes de grande pianista (…)"; peças de Ricardo Porfírio d’Afonseca tocadas pela sua neta, Maria Amelia da Camara; composições de Duarte Joaquim dos Santos; e o bailinho da madeira, dançado pelos alunos do coreógrafo Germano Soares.
As causas de beneficência acompanharam Maria Paula Klingelhöfer Rego ao longo de toda a sua vida. Para além das doações feitas ao asilo, em 1907 prometeu ao Bispo do Funchal, D. Manuel Agostinho Barreto, a oferta da Quinta do Trapiche à Ordem de S. João de Deus. A intenção de Maria Paula K. Rego era a fundação de uma Casa de Saúde para doentes mentais. A doação foi efetivada a 22 de Fevereiro de 1922, quando a Quinta do Trapiche foi entregue à diocese do Funchal. Posteriormente o espaço foi cedido aos irmãos António Maria Rodrigues e Manuel Maria, que fundaram a Casa de Saúde do TrapicheV.
Maria Paula K. Rego faleceu em sua casa, situada na Travessa da Fábrica, no dia 1 de Junho de 1922, vítima de complicações cardíacasVI.
Deixou em testamento cerca de 90 propriedades com um valor total superior a 100,000$00 ("contos de réis"). O que seria equivalente a uma fortuna milionária na atualidade.
Entre os beneficiários do seu testamento constam Jane Mary Wilson, natural da India inglesa, radicada na Madeira, criou obras de assistência social, especialmente para a educação feminina; o padre Manuel Joaquim de Paiva, também músico reconhecido pela sua participação na reforma musical da igreja ocorrida no início da século XX, com base no decreto do Motu Propio; Maria Pisten e Joaquina Salomé, das quais não constam outras referências.
Sobre a atividade musical que Maria Paula Klingelhöefer Rego exerceu ao longo da sua vida, a relação de bens inclui referência a um piano, catalogado como "em mau estado"; e duas violas pequenas de madeira (também catalogadas em "mau estado"), ou dois machetes tendo em conta que a proproetária era conhecida pelas suas excelentes interpretações neste instrumento musical.
CAMACHO, Liliana (2011). "Maria Paula Klingelhöefer Rego". Dicionário Online de Músicos na Madeira. Funchal: Divisão de Investigação e Documentação, Gabinete Coordenador de Educação ArtísticA, 06/03/2011.
VENTURA, Ana (2011)."REGO, Maria Paula Klingelhöefer". Dicionário Online de Músicos na Madeira. Funchal: Divisão de Investigação e Documentação, Gabinete Coordenador de Educação Artística, 18/10/2011.
SILVEIRA, José Marciano da (1871). "A Voz do Povo". In Coleção de Jornais - Biblioteca do Arquivo Regional da Madeira [s.n. recurso eletrónico]. Funchal: Typographia da Voz do Povo, publicado em 02/03/1871, p. 2.
SILVEIRA, José Marciano da (1871). "A Voz do Povo". In Coleção de Jornais - Biblioteca do Arquivo Regional da Madeira [s.n. recurso eletrónico]. Funchal: Typographia da Voz do Povo, publicado em 06/04/1871, p. 4.
SILVEIRA, José Marciano da (1871). "A Voz do Povo". In Coleção de Jornais - Biblioteca do Arquivo Regional da Madeira [s.n. recurso eletrónico]. Funchal: Typographia da Voz do Povo, publicado em 13/04/1871, p. 4.
SILVEIRA, José Marciano da (1873). "A Voz do Povo". In Coleção de Jornais - Biblioteca do Arquivo Regional da Madeira [s.n. recurso eletrónico]. Funchal: Typographia da Voz do Povo, publicado em 04/12/1873, N.º 608, p. 3.
SILVEIRA, José Marciano da (1874). "A Voz do Povo". In Coleção de Jornais - Biblioteca do Arquivo Regional da Madeira [s.n. recurso eletrónico]. Funchal: Typographia da Voz do Povo, publicado em 15/01/1874, N.º 613, p. 3.
I MORAIS, Manuel (2008). A Madeira e a Música - Estudos [c.1508-c.1974]. Funchal: Empresa Municipal 500 Anos do Funchal, p. 104.
II SILVEIRA, José Marciano da (1861). "A Voz do Povo". In Coleção de Jornais - Biblioteca do Arquivo Regional da Madeira [s.n. recurso eletrónico]. Funchal: Typographia da Voz do Povo, publicado em 21/03/1861, pp. 2-3.
III A Flor do Oceano (s/d). "Coleção de Jornais". In Biblioteca do Arquivo Regional da Madeira [s.n. recurso digitalizado]. Funchal: I Ano, N.º 29, pp. 2-3.
IV A Flor do Oceano (1866). "Coleção de Jornais". In Biblioteca do Arquivo Regional da Madeira [s.n. recurso digitalizado]. Funchal: publicado em 03/03/1866, p. 4.
A Flor do Oceano (1866). "Coleção de Jornais". In Biblioteca do Arquivo Regional da Madeira [s.n. recurso digitalizado]. Funchal: publicado em 17/03/1866, p. 4.
V (S/d). História – Irmãos São João de Deus. Disponível em http://www.isjd.pt/cssjd.funchal/, consultado a 15/03/2011.
VI Diário de Notícias (1922). "Coleção de Jornais". In Biblioteca do Arquivo Regional da Madeira [s.n. recurso digitalizado]. Funchal: publicado em 2/06/1922, p. 2.